
Todo ano a mesma coisa. No fim do verão, ao menor sinal de umidade ou chuva, ao abrir a porta da cozinha, o espetáculo deslumbrante da floração do café. Nos últimos 20 anos, tem acontecido entre o final de outubro e princípio de janeiro. Uma explosão de branco e cheiros que deslumbra a todos.
Durante o verão, após a colheita, o cafezal vai se preparando para a próxima safra. Tão logo sente que o tempo vai mudando, a umidade crescendo, qualquer chuvinha provoca a abertura dos botões. Botânicos utilitaristas afirmam que grande parte da polinização ocorre com o botão ainda fechado, por ser planta hermafrodita. Felizmente, a natureza não cai nesta conversa e nos brinda com uma manifestação de beleza inebriante, procurando garantir a plena fecundação de todas as flores.

O café tem importância fundamental na economia do Brasil, seu maior produtor e exportador. Aqui, no Ceará, é cultivado em regiões serranas, como a Ibiapaba e o Maciço de Baturité, à sombra de árvores, cabrucadas para atender a necessidade de luz do cafeeiro. Nos 1970, foi proposta uma modernização da cultura, cultivando-o a pleno sol, depois de um desmatamento irresponsável e insano. Após colheitas iniciais fabulosas, o modelo mostrou-se insustentável. Tecnocratas que ignoram a realidade são um desastre total, na agricultura ou na economia. No sítio, temos uma área de café da sombra, tradicional, que aumenta o encanto provocado pelas flores brancas, no estrato intermediário, dialogando com as outras plantas. Produzindo um grão, de bebida diferenciada, pra consumo próprio, sobrando um pouco, nos anos melhores para dividir com outros. Vamos esperar que a chuva venha na hora e quantidade certas, garantindo boa colheita.
A floração é o ritual de sexo das plantas. A estratégia que usam para perpetuar a espécie. Mostra que, mesmo pra reprodução, o sexo não tem de ser aquela coisa insípida, inodora e incolor, apregoada por próceres religiosos com a mente e o coração tomados pelo pecado. Envolve alegria, sedução, cores, cheiros, enfim variada gama de estratagemas para que o fim seja atingido com criatividade e prazer. A Natureza precede nossa presença no mundo. Aprendamos com ela, pois dela depende nossa vida. A flor do café é efêmera. Ao final do dia fica marrom e murcha. Mas todo ano explode de novo, mostrando que a vida sempre se renova. Vivamos, pois.
