Baptista

Quando criança sempre achei que o dia de São João era 23 de junho. Neste dia, com uma grande fogueira e muita festa, se celebrava o aniversário do Sêo Batista, João Baptista de Oliveira, escrivão da Coletoria Federal de Piracuruca, meu pai. Juntava gente de montão, comidas, bebida, fogos e simpatias próprias da data. Uma festa de arromba, de se guardar para sempre no coração e mente. Já maduro, morando na roça, com os vizinhos estranhando o fato de eu fazer grande fogueira na véspera, é que me dei conta que o dia de São João era no 24 do mês.

Baptista era assim, animado e festeiro. Quando rapaz, pedalava léguas numa bicicleta para folgar num arrasta-pé. Em pelo, pra não suar a roupa de festa, mas com o risco de gozação se encontra conhecidos no caminho. Exímio pé de valsa, de fala mansa e envolvente é sucesso com as moçoilas. Ganha a pecha de namorador. Ao saber da fama, uma cearensezinha atrevida quis conhecê-lo: – aquele neguim ali!?! vai comer mansim na minha mão. Dito e feito.

Nossa convivência com Baptista começou anos depois, que o casal demorou a ter filhos. E foi repleta de vivências que deixaram legado importante. Como me levar pela mão, pequenino, ao mercado de Piracuruca quando ia fazer compras. Tão importante, que fiquei revoltado quando não me deixaram levar no passeio meu irmão que nascera na véspera. Ou suas proezas de salto mortal na ponte do rio Mal Cozinhado, em Cascavel, mergulhando com graça na água, sob os olhares de admiração e inveja dos presentes e de censura da mamãe. Criar vacas pra garantir leite de qualidade para os filhos, desconfiado da lisura dos leiteiros. E pautar suas transferências no serviço público às necessidades escolares dos filhos. Um rosário de peripécias e aventuras, cheios de ensinamentos, pelos sertões, serra e litoral no Piauí e Ceará.

Amoroso, espalhava a bondade e tinha especial prazer em fazer agrados às pessoas. Quando chateado ficava amuado, mas a birra passava logo. Não guardava rancor, não cultivava ódio, não criava inimizades. Numa rusga de família, quando seus irmão se intrigaram com um deles, não tomou partido e continuou a tratar a todos com o mesmo amor e respeito, sem deixar de frequentar nenhum. Era querido e respeitado por eles. Bem humorado, sempre tinha um chiste, uma pilhéria, um elogio, um galanteio e sendo o caso, uma ironia ferina. Adorava crianças e com elas se comportava como tal, sendo um ídolo dos sobrinhos e netos. Quando morava em Belzonte, meus filhos aguardavam com ansiedade as ‘encomendas’ que ele mandava, regularmente, cheias de sabores,cheiros e mimos.

Seus 80 anos de vida, plena de façanhas e epopeias, foram comemorados com fogueira e tudo mais de direito, conforme o figurino. A família reunida, amigos, comes e bebes nos trinques, como a data exige. Hoje, saudade muita, tristeza nenhuma que o dia é de festa e as memórias boas. Baptista vive. Viva São João!

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